A ARTE MUTANTE DE CÍCERO DIAS


Em 1948 Cícero Dias esteve na Faculdade de Direito do Recife e causou espanto com a exposição que fez ali, pois seus quadros causaram frisson por causa do que eles representavam naquele momento, o que não era algo com o que o povo pernambucano estava acostumado a ver, e Máro Melo bem explicou a seus leitores isso.
A exposição que mais "causou" foi o quadro  do "Mamoeiro ou dançarino", o que deixou muita gente intrigado se era um ou o outro. E isso foi questão até para debates entre Mário Melo e outros intelectuais da época em voga.
O problema é que aquilo era uma renovação, e estava causando um desequilíbrio para a arte e para o que ela representava naquele momento. A pintura de Cícero Dias não era para deixar o indivíduo na mesma, trazia uma dualidade uma releitura do que estava já estabelecido no momento. Ele inovou e mudou conceitos.
É verdade que à primeira vista a Arte pode ser mal compreendida e até causar mal estar na pessoa que admira, mas ela faz isso de uma forma que não deixa de ter sua beleza, ou espantar por essa beleza que pode  ser vista por quem admira. Ela, a Arte, é imprevisível sempre.
O exemplo disso é a música, que é a arte mais penetrante e a mais abrangente,a que tem a linguagem mais variada, principalmente por que não precisa passar pelo intelecto para ser compreendida, mas ela precisa ser sentida, mais do que vista, ou lida. O ouvido é símbolo de algo mais profundo, a entrada da alma. Por isso que ela mexe tanto com os sentimentos.
Se a pintura de Cícero não foi logo aceita ou causou espanto, foi pelo fato do cânone, da Academia e da intelectualidade "congelar" a Arte, de impedir que ela seja livremente interpretada, seja pelo povão, não acostumada a ela, seja pelos mais favorecidos, que podem olhar para ela sem o filtro dos intelectuais guardiões do saber. Se ela chegasse livremente ao povo, ela seria tão compreendida, ou até mais, por um boiadeiro, um cidadão comum, mesmo que não tivesse um átimo de  cultura desses intectuais, e poderiam até penetrar mais a fundo nela. Talvez a Arte perca muito de si mesma quando ela se torna prisioneira das elites, só eles as podem interpretar, como as pitonisas de Apolo e de Baal. É sabido que Recife entende tanto de arte quanto Rio ou São Paulo, e as pessoas podem compreender ela totalmente, ou pelo menos em boa parte, já que ela é tão penetrante.
Mas os preceitos intelectualistas impedem também que a Arte possa ser entendida como deve ser, não conforme as regras dos intelectuais, mas conforme a mensagem que penetra na mente e no sentimento do indivíduo, e foi o que Cícero Dias quis passar várias vezes. Ele também tem falado que a Arte é um processo contínuo ao longo dos séculos. Não para nunca, sempre se transforma, é viva.
Desse modo, ao longo do tempo, a arte de Cícero Dias ficou abstrata, foi ficando com cores mais vivas, mais universal, e saiu do provincialismo. Se deixou influenciar por Picasso e outros artistas que usaram uma linguagem e  temas universais em suas artes. Ele cresceu bastante, mais ainda resta nele a assinatura da cultura pernambucana, pois não dá para se desvencilhar de vez dela. Ainda fica algo que o identifica como um nordestino.



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